segunda-feira, 16 de maio de 2011

"É uma ilusão; esse dia ficará marcado"

A razão do consumo. Foto: Sonho Tcheco(2005)


Foi tudo muito polêmico. Tornou-se possível fazer de um público o alvo do espetáculo. Foi com esse propósito que o documentário Sonho Tcheco tornou-se a referência analítica sobre o que a midiatização é capaz de gerar, desde uma suposta satisfação pessoal até uma mentirosa e insana propaganda destruidora de sonhos.

Os estudantes de Cinema Vít Klusák e Filip Remunda montam uma grandiosa especulação acerca de mais um hipermercado que chegaria na região, informando pelos diversos meios de comunicação suas promoções e vantagens. Ironicamente, os criadores do projeto também inserem o tipo de propaganda “do contra”, a qual insiste em também perseguir o espectador com sua filosofia do não a todas as possíveis “bem feitorias” geradas pela mídia e pelo suposto hipermercado. Nessa teia de múltiplas informações é que o homem midiático tcheco envolve-se pelas correntes publicitárias, pois ele acredita piamente na possibilidade solucionadora e poderosa dos anúncios comerciais, ele acredita no que é novidade, ele acredita no desconhecido.

Inicialmente, ainda é tudo novo para uma sociedade em que outrora transparecia o limite do consumo e agora surge uma face totalmente revertida pela constante mostra da necessidade do mercado. Significa que tamanha “autofagia” mercantilista é o resultado dessa relação travada não só nas civilizações mais maduras a esse sistema, mas também as que a ele representam uma novidade.

O “sonho” esmoreceu ao se esclarecer a malandragem do sistema, não exatamente do sistema, mas dos membros vivenciadores e produtos do mesmo e que procuram captar a mensagem do lucro sobre os desejos alheios. Em outras palavras, a marca do capitalismo, assim como afirmou o pensador pós-moderno Jean Baudrillard, é a do consumismo automatizado, tanto que as mercadorias são consideradas verdadeiros signos dessa sociedade.

A idéia dessa automatização da cultura, justamente pela “sociedade-cultura” de Baudrillard, atenta para afirmações um tanto falsificadas e levadas ao extremo da irrealidade, algo demasiadamente ideológico. A grande quantidade de informação dada a um determinado produto, como foi o caso de Sonho Tcheco e sua voraz publicidade do tal hipermercado, enfatizou ainda mais outro termo entendido como a incerteza a que o telespectador está exposto. O tanto de mensagens propagadas faz o homem se perceber como espectador de múltiplas certezas, ou na verdade de incertezas, pois qual será a credibilidade do “não compre”, “não vá”, se há outra face ao agir de maneira oposta, portanto, convidativa?

Os signos evoluíram, tomaram conta do mundo e hoje o dominam. Os sistemas de signos operam no lugar dos objetos e progridem exponencialmente em representações cada vez mais complexas. O objeto é o discurso, que promove intercâmbios virtuais incontroláveis, para além do objeto. Em 'A Economia Política dos Signos', a indústria do espetáculo ainda engatinhava e os signos cumpriam a função simples de substituir objetos reais. Atualmente, cada signo está se transformando em um objeto em si mesmo e materializando o fetiche, virou valor de uso e troca a um só tempo. Os signos estão criando novas estruturas diferenciais que ultrapassam qualquer conhecimento atual.
(BAUDRILLARD, 2003).


Baudrillard também salientou que, devido à propaganda comercial, as vontades passaram a ser semelhantes e sempre a procura de resoluções conforme às práticas de consumo. Ao gerar expectativas, constata-se que há manipulação dos desejos, de todas as formas que possam equivaler à satisfação pessoal, e, assim, maior propensão para o constrangimento.

Portanto, distribuir inverdades e analisar o comportamento do homem frente à sua influência: este foi o maior intento do filme, além de refletir sobre os aspectos fidedignos desta sociedade, se esta é realmente a sociedade do espetáculo. Se todos os financiamentos possíveis têm verdadeiros e concretos projetos. Se tudo o que existe é algo completamente fora de alcance e que não passa de sonhos e ilusões. Enfim, se os acontecimentos convergem para o pensamento platônico de apenas o verdadeiro provir de outro mundo, altamente desconhecido pelo homem.

Sonho Tcheco adverte para essas questões, tanto que pode contribuir com uma profunda reflexão da população acerca das muitas influências da mídia sobre pessoas como elas; mais até do que o imaginado. Uma grande persuasão. Um consumismo alienado.


Ver mais:
http://www.ceskatelevize.cz/specialy/ceskysen/en/index.php?load=aktualne



Referência:
- BAUDRILLARD, Jean. Entrevista: Revista Época. 2003;




*No título, palavras de um espectador.